É sério, a pessoa pode ser muito estudiosa de um assunto e isso não a transforma em uma referência em todos os assuntos do mundo não, isso rola demais na internet e precisa ser combatido para evitar que se crie personalismos e "tudólogos". Dito isso, NÃO EXISTE ISSO DE DIZER +
HEGEL FOI RECHAÇADO DO PENSAMENTO OCIDENTAL.

Não tem cabimento sob nenhum sentido. E aqui não é indireta, eu pedi referências, coloquei meus pontos e a única resposta que tive foi: "vá ler Lenin". Afirmar que Hegel foi rechaçado no ocidente citando apenas o diagnóstico da +
situação do pensamento ocidental de Lenin é um anacronismo, pois desconsidera que o quadro que Lenin descreve é de mais de 100 anos atrás - e isso não significa dizer que a qualidade da leitura de Lenin sobre Hegel seja ruim, são coisas diferentes. E nesse caso é preciso provar +
que o quadro do pensamento ocidental é o mesmo de Lenin 100 anos depois, refutando cada autor ocidental que se diz hegeliano.

Coloquei esse trecho do livro "Patologias do social: arqueologias do sofrimento psíquico" (org. de Vladimir Safatle, Christian Dunker e Nelson +
da Silva Júnior) para ilustrar que a relação entre a lógica dialética, herança de Hegel, e conceitos kantianos em Adorno e Horkheimer (que, até onde sei são ocidentais e assimilaram Hegel).

Fora o trecho que trouxe, é uma ignorância ler Hegel como negador de Kant, colocando a +
divisão Kant vs. Hegel como um antagonismo radical.

1) Hegel não se propôs a ser um negador de Kant, ou seja, destruir o sistema kantiano, mas de superar, no sentido dialético do termo: assimilar criticamente para ir além das limitações que Hegel encontrou no pensamento +
kantiano.

2) A filosofia ocidental contemporânea é, principalmente do séc. XX para cá, uma reverberação desse debate Kant vs. Hegel, seja na filosofia política, filosofia do Direito, ética, moral etc. Afirmar que o hegelianismo não é hegemônico é muito diferente de afirmar que +
é rechaçado no ocidente.

3) E se somente o oriente soube capturar a essência do hegelianismo, via assimilação de Hegel por Marx - e eu nem preciso dizer, não sendo o marxismo dono das possibilidades hermenêuticas oriundas de Hegel - o quanto isso é problemático, quais autores +
orientais são esses? Por que eles não participam dos grandes círculos hegelianos mundiais?

4) Também é ignorância afirmar que há entre Hegel e Marx um continuísmo linear; houve uma assimilação tortuosa e cheia de conflitos, pois Hegel e Marx são pensadores, apesar de +
pertencentes a mesma tradição, muito distintos por inúmeros motivos, inclusive históricos, como nos aponta Lukacs em "O jovem Hegel".

5) Assim como é ignorante afirmar que somente o marxismo, oriental em específico, capturou a essência do pensamento de Hegel. a) Que não +
existe isso de uma essência de pensamento intocado; e b) que o próprio Losurdo em "Hegel e a liberdade dos modernos", ainda que defenda sua leitura do hegelianismo, não ignora a validade e a possibilidade lógica das outras leituras existentes. +
6) Então, se Losurdo está correto e Marx não é o único a fazer uma leitura coerente de Hegel, ainda que eu ache que a leitura de Marx seja a mais potente para apreender o real, para se afirmar que Hegel não é aceito no ocidente é preciso refutar toda uma tradição gigantesca, +
que não é uma exceção, dos desdobramentos do hegelianismo. Tirando as leituras liberais e conservadoras de Hegel, só para ficarmos na "esquerda hegeliana", podemos citar a Escola de Frankfurt (sugiro a leitura de "A imaginação Dialética de Martin Jay, que comenta a assimilação +
de Hegel por esses autores), mas também autores tão diversos quanto: Kojeve, Hyppolite, Charles Taylor, Leandro Konder, Judith Butler, Zizek, Vladimir Safatle, Marcos Nobre, Arthur Danto, Jacques Ranciere, Alain Badiou etc. +
Ou seja: Hegel ser um autor rechaçado no ocidente é um argumento sem fundamento na realidade dos fatos e, querendo ou não, ainda que não se goste da assimilação ocidental de Hegel, ela existe, é enorme e não pode ser jogada no lixo facilmente sem se passar por ignorante. +
Além dos livros já citados, sugiro também as leituras de:

- Filosofia en Alemania (Hebert Schnadelbach)
- De Hegel a Nietzsche (Karl Lowith)
- Hegel: Compêncio da Universidade de Cambridge (Org. Fredrick C Beiser)

+
Humildade, cuidado nas afirmações, não querer falar do que não conhecemos, não se ludibriar com jargões (universal e particular) e estudo... nunca é demais.

Boas leituras!

PS: Falo ignorante não como ofensa, mas como ignorância, no sentido de quem desconhece.
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