Nagualismo:

Nagual, do Nahuatl: “Nahualli” (oculto) dentro das crenças mesoamericanas, é a capacidade humana de assumir uma forma animal.

O termo se refere tanto à pessoa que possui essa capacidade quanto ao próprio animal que atua como seu ‘alter ego’ ou animal guardião.
O conceito é expresso em diferentes línguas nativas, com diferentes significados e contextos, mas a prática ou capacidade de algumas pessoas de se transformarem em animais, elementos da natureza ou realizarem atos de feitiçaria é chamada de nagualismo.
A prática está ligada ao sistema de calendários mesoamericanos. A data de nascimento geralmente determina se uma pessoa pode se tornar um nagual.
A crença no tonalismo, em que cada pessoa tem uma contraparte animal a qual sua força vital está ligada, é inspirada pelo nagualismo.
O nagual é adquirido no nascimento, junto com outras características associadas ao dia de nascimento e cada dia está associado a um animal.

Em Nahuatl, a palavra “tonalli” é usada para se referir tanto a um dia quanto ao animal associado a esse dia, entre outros significados.
O tonal não era de forma alguma uma posse irrevogável, era uma espécie de mascote independente.

Enquanto estivesse com uma pessoa, ela gozava de saúde e prosperidade, mas poderia partir, se extraviar, perder-se, e, então, a doença e o infortúnio chegariam.
É demonstrado na língua nahuatl pelos verbos tonalcaualtia, para “checar, parar ou suspender” o tonal, portanto, para chocar ou assustar alguém, e tonalitlacoa, para ferir ou prejudicar o tonal, portanto, para enfeitiça-lo.
Isso explica as conjurações e encantamentos realizadas pelo médico nativo quando visitava os enfermos.

Era para lembrar o tonal, forçá-lo ou persuadi-lo a retornar, e, portanto, a cerimônia tinha o nome de “a restituição do tonal” e estava profundamente imbuída ao nagualismo.
Feiticeiros e xamãs da Mesoamérica podiam criar um vínculo muito próximo com seus naguals, o que lhes dava uma série de vantagens como a visão do falcão, o olfato do lobo ou a audição da jaguatirica e alguns podem até adquirir a forma do seu nagual em teriantropia.
Os mais experientes praticantes dessa magia geralmente nasciam durante um período relacionado ao jaguar ou puma, e apenas aqueles que podiam conhecer intimamente e canalizar seu espírito animal podiam controlar seus poderes de metamorfose/teriantropia.
A descrição mais antiga de seus ritos particulares é a que o historiador Herrera dá em 1530, na província de Cerquin, Honduras:

“O Diabo estava acostumado a enganar esses nativos aparecendo para eles na forma de felinos, coiotes, lagartos, cobras, pássaros ou outros animais. +
A essas aparências, eles aplicam o nome de Naguales, que é o mesmo que dizer, guardiães ou companheiros, e quando tal animal morre, o mesmo ocorre com o índio a quem foi atribuído. A forma como essa aliança foi formada foi a seguinte:
O nativo dirigia-se a um local bem afastado e dali iria para os riachos, rochas e árvores ao seu redor e então sacrificava um cachorro ou uma ave e tirava sangue de sua língua, ou de suas orelhas, ou de outras partes de seu corpo, e adormecia.
Em seus sonhos ele via algum animal que lhe diria: 'Nesse dia, vá caçar e o primeiro animal ou pássaro que você vir será a minha forma, e eu irei permaneçer seu nagual para sempre’. Assim a ligação deles tornava-se tão próxima que, quando um morria o outro teria o mesmo destino”
No México antigo, a ideia da união mística entre homens e animais era muito difundida, os olmecas, por exemplo, tinham como uma das bases de sua cosmologia a associação ao jaguar e eram capazes de se transformar simbolicamente em homens-jaguares, como mostram seus artefatos.
O sistema de calendário mesoamericano tinha como um de seus principais objetivos, a divinação astrológica.

Ao consultá-lo, o nagual apropriado era descoberto e designado, e isso certamente era uma característica proeminente no culto nativo e nunca foi abandonado.
O nascimento é regulado pelo curso e movimentos das estrelas e planetas e, observando a hora do dia e os meses em que uma criança nasce, prognostica sua condição e os eventos, prósperos ou não, de suas vidas.
Os nagualistas praticam suas artes por meio de repertórios e calendários, onde estão representados todos os naguals de estrelas, elementos, pássaros, peixes, bestas e animais, com uma tabela de dias e meses que anunciam o que corresponde ao dia de nascimento da criança.
Outra prática do nagualismo é o uso de plantas enteógenas, como o peyotl (peiote), um cacto, contendo o princípio ativo da mescalina, da qual parece ter desempenhado um papel proeminente nas cerimônias.
O peiote não era a única erva valorizada como meio de lançar a alma na condição de união com a divindade e o nagual. Temos evidências abundantes de que as sementes da planta chamada ololiuhqui (glória da manhã) eram muito apreciadas para esse propósito.
Quem participava dessas ritos era chamado payni (do verbo ‘tomar remédio’), e mais especialmente tlachixqui, um vidente, referindo-se à “segunda visão” mística, portanto, um adivinho ou profeta (do verbo tlachia).
A intoxicação por meio dessas ervas era parte fundamental dos ritos do nagualismo já que proporcionavam um contato direto entre a pessoa e o seu nagual, plantas possuindo efeitos semelhantes nos ritos mágicos, eram a thiuimeezque, em Michoacán, e o chacuaco, na baixa Califórnia.
Na cosmologia asteca, o deus Tezcatlipoca era considerado o ‘padroeiro’ dos naguals, seu nagual era o Jaguar, na qual suas manchas simbolizavam o céu estrelado. Nessa forma, Tezcatlipoca se apresentava como Tepeyollotl.
O glifo maia ‘wayob’ se refere a transformação animal, mas também está relacionado ao sono e, portanto, aos sonhos, indicando que quem dorme pode ser capaz de entrar em contato com seu nagual por meio de sonhos, assim como outros atos rituais.
O nagualismo e a feitiçaria estão ligados às saídas do espírito durante a noite, assim, feitiçaria e nagualismo também se assemelham ao xamanismo pois os xamãs guiam seu próprio alter ego (nagual) pelo reino dos sonhos afim de curar os enfermos, entre outros atos.
O nagualismo foi popularizado nos livros do autor Carlos Castaneda.

Ele definiu o nagual como "o professor que se torna o portal, a porta, o intermediário entre o mundo do 'buscador' ou aprendiz, e o mundo do espírito”.
Com a chegada dos europeus, muitas crenças trazidas por eles acabaram se misturando com as indígenas, como o caso da licantropia, o que fez com que os naguals se popularizassem também como “folclore”, mas é importante lembrar que são originalmente das cosmologias indígenas.
Hoje, em muitas regiões em comunidades rurais do México, acredita-se que os naguals sejam uma espécie de feiticeiro poderoso (brujo) que bebe sangue humano, matam gado, roubam ou destroem propriedades e espalham doenças.
Em algumas comunidades, os naguals são figuras piedosas, de autoridade reverenciada, temidas e respeitadas por seu poder.

Em outras, é visto como equivalente à bruxaria, podendo causar vítimas com violentos ataques físicos.
O nagualismo é um tema extenso que demanda bastante estudo e tempo para aborda-lo por completo, mas é, de fato, um importante aspecto das cosmologias mesoamericanas e ainda nos traz luz sobre o entendimento totêmico da união entre natureza-humano da época pré-colombiana.
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