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O que a J.K. fez com Harry Potter foi uma reciclagem da jornada do herói e elementos fantásticos presentes em Tolkien e Carroll. Ela juntou essa reciclagem com símbolos, criaturas e mitos presentes na literatura grega e assim nasceu Harry Potter. Explico nos próximos tweets ⬇️
A jornada do herói nada mais é do que uma teoria desenvolvida por Joseph Campbell que diz que todas as histórias tem um lugar comum, um fio condutor em comum. Segundo a teoria dele, os elementos da jornada do herói estarão sempre presentes nas histórias.
Então é ruim escrever em jornada do herói? Não! Pensem na jornada do herói como uma receita de bolo que deu muito certo, e cada autor experimenta essa receita alterando algumas coisas pra dar a sua própria identidade àquela receita. Ok, o que isso tem a ver com HP?
(ignorem minhas anotações). Se vocês forem ver os passos básicos da jornada do herói, conseguimos facilmente encaixar a saga nessa receita, com o adendo de não houve sequer uma alteração na ordem dos fatores ou elementos componentes pra enriquecer a narrativa.
"Virgínia mas são 7 livros". O que a J.K. fez foi trabalhar os três atos da jornada do herói até o "caminho de volta" até o terceiro livro. Em Cálice de Fogo ela vai só até o segundo ato, e aí ela reinicia o ciclo distribuindo os três atos ao longo dos últimos três livros.
Por exemplo, vamos analisar A pedra filosofal: o livro começa na Rua dos Alfeneiros, conta sobre o mundo dos trouxas e a vida do Harry nesse mundo - o único mundo com o qual ele está familiarizado. O uso do desiluminador no momento em que vão entregar o Harry aos Dursley
é uma maneira de dizer que aqueles elementos de fora da realidade do herói (Dumbledore, Minerva e Hagrid) permanecerão ocultos para ele até o "chamado para a aventura".
Aí temos o chamado para aventura, que acontece quando Harry começa a receber as cartas, e depois recebe a visita de Hagrid. Qual a primeira coisa que o Harry responde quando Hagrid conta que ele é um bruxo? "Eu sou o que?!" e depois de ler a sua carta de Hogwarts
O Hagrid conta como os pais dele morreram, fala um pouco sobre o Voldemort mas mesmo assim o Harry olha pra ele diz "acho que você está enganado, eu não posso ser um bruxo", e e o pensamento dele "se eu derrotei um bruxo como o Voldemort como que o Duda me apurrinha tanto?"
Esse momento de se questionar e colocar em dúvida o chamado à aventura foi colocado com o único propósito de seguir a receita da jornada do herói, porque é nesse momento que o leitor começa a criar identificação com o dito herói.
O próximo passo é o encontro com o mentor, e notem que mesmo antes de conhecer o Dumbledore, o Harry ouve muito sobre ele do Hagrid, e já coloca ele uma posição de mentor para si - tanto que ele passa o livro todo admirando o Dumbledore e olhando pra ele.
Lembra que eu disse que os últimos três ciclos são como uma versão estendida da jornada do herói? No Tweet anterior, em uma das sortes grifadas, vemos que o mentor só pode ir até certo ponto com o herói, e é por isso que o Dumbledore morre em enigma do príncipe.
Você nunca achou estranho o Dumbledore tão inteligente não ter destruído e achado as horcrux por conta? Pois é, a J.K. ignorou o desenvolvimento de personagem pra dar sequência a essa parte importante da jornada do herói, que é exatamente o herói correr atrás das coisas sozinho
Por que a J.k. fez o Sirius de padrinho e não o Lupin? Porque ela precisava de mais uma figura de mentor pro Harry, e já que o Sirius vai pra Azkaban restou o Lupin - duas figuras ligadas ao pai dele que entram pra representar essa relação de pai e filho.
Mas voltando à pedra filosofal: a travessia do primeiro limiar é quando o Harry vai comprar seu material escolar no beco diagonal. Ele tá conhecendo todas aquelas coisas novas pela primeira vez. E a J.K. é uma autora tão estupidamente preguiçosa que única e exclusivamente
Pra seguir a receita da jornada do herói sem modificar nada ela incluiu a cena em que o Harry e o Draco se encontram na loja de uniformes. "Mas se ela tá seguindo a jornada pq ela e preguiçosa?". O que impressiona no trabalho do escritor é como ele vai usar essa e/ou
Outras receitas pra compor a história dele. Não tem absolutamente nada de inovador em seguir a jornada do herói à risca, não se dando nem ao trabalho de alterar a ordem dos fatores, então ela vai encaixando esse tipo de cena nos livros.
Prestem atenção em "objeto de busca". Não é à toa que o Harry precisa caçar e destruir horcruxes, reparem em todos os momentos com as horcruxes são uma repetição da aproximação da caverna oculta. O primeiro livro é sobre a pedra filosofal porque a jk precisava de algum objeto
Que fosse o objeto de busca do Harry. Todo o último arco da pedra filosofal é sobre o Harry querendo pegar a pedra antes do Snape. Ele não quer usar a pedra, mas ela se torna seu objeto de busca no que ele se coloca determinado a achar a pedra antes do Snape.
"O herói tem que morrer pra renascer em seguida". Tá aí o motivo pelo qual o Harry é uma horcrux. Você nunca achou absolutamente inverossímil que o feitiço ricocheteou por causa do amor da Lily pelo Harry? Porque se fosse assim muita gente deu a vida por quem amava e as pessoas
Morreram do mesmo jeito. Por que só o Harry? Porque a JK é uma escritora que peca tanto na sua própria estilística que ela inventou qualquer coisa pra poder colocar um arco de ressureição pro Harry. Até o terceiro livro ela coloca esse arco de maneira metafórica.
Voltando à pedra filosofal, o Harry ver seus pais no espelho e ouvir o convite de Voldemort pra se juntar à ele é a morte metafórica do Harry - o momento em que ele escolhe se vai sucumbir ou arriscar sua vida. As características da grifinória não são nada mais do que as
Características do herói colocadas em poucas palavras. Notem quantos heróis são comumente relacionados com a grifinória: Luke Skywalker, Naruto, Frodo Bolseiro, Martin (procurando Nemo), a lista é extensa e vai bem longe
Em pedra filosofal, isso aqui vem como uma recompensa simples (a taça das casas). Mas em relíquias da morte temos o capítulo do Harry conversando com mentor em King's Cross, e sua recompensa é todo o conhecimento que ele depreende daquela conversa
A Voldemort voltando com o Harry "morto" é o caminho de volta, enquanto o momento com o Dumbledore se presta tanto ao papel de recompensa quanto ressurreição. Acho que não preciso dizer nada em relação ao item 11, ela seguiu absolutamente à risca.
Aqui também acho que não preciso dizer muito, o fato de todo mundo morre ou casar no final tem o propósito de cumprir a última fase da jornada do herói.
Podia muito bem ser um resumo de Harry Potter, as são os passos da jornada do herói, que ela fez questão de seguir a risca sem adicionar um único elemento estilístico original ou inovador.
Passando do ponto de que a espinha de Harry Potter por si só já não é nada original e fora do esperado pra um herói, vamos analisar os elementos fantásticos do livro. Muita gente acha a Jk brilhante porque ela "criou" todo um universo mágico. Bom gente, a verdade é que ela não
criou quase nada, ela só fez incluir elementos fantásticos que já existiam na literatura. Vamos começar pelas criaturas: a maioria das criaturas presentes em Harry Potter existem de forma idêntica ou muito parecida na mitologia grega. Hipogrifo, basilisco, fênix, unicórnio etc.
E se você pegar pra ler o Animais fantásticos e onde habitam, vai ver que as criaturas que parecem originais foram meramente adaptadas de criaturas que já existiam no universo fantástico. Testrálios por exemplo são originais do universo de Harry Potter, no entanto
cavalos alados não, e o que é um testrálio? Um cavalo alado com aparência de morte e cuja especificidade é que apenas quem já viu a morte pode vê-los. O quão criativo isso parece agora? E eu poderia ir fazendo essa mesma análise criatura por criatura.
O mesmo vale pra artefatos mágicos, temos poucos que são de fato uma novidade dentro do gênero de fantasia. E quando são, assim como os testrálios, acabam sendo versões de outras coisas já enraizadas no universo literário da fantasia.
Por que eu digo então que ela soube vender o peixe de,a? Porque a JK encheu a saga de vários pequenos detalhes que dão margem à produção de conteúdo e consumo daquela obra. Não é à toa que a história dos marotos é mal desenvolvida. Ela é mal desenvolvida porque histórias com
Lacunas dão margem para que os fãs queiram criar suas próprias teorias, e falar sobre elas com outras pessoas, o que ajuda na propagação da obra. A pedra filosofal lançou em 1997, a fanfic de Harry Potter mais antiga do http://fanfiction.net  é de 1999.
Os anos 2000 foram uma época de ascensão das fanfics, muitos livros estavam ganhando legiões de fãs por causa de fanfics, as lacunas de Harry Potter estão pra instigar pessoas a criarem histórias, histórias que vão ajudar a "eternizar" a obra dela. Não só isso mas
A adição de elementos que podem facilmente ser transformados em produtos combinada com livros que possuem uma linguagem fácil de compreender mas não fácil o suficiente pra que você sinta sua inteligência subestimada ao ler culminou no sucesso dos livros, e a adaptação
cinematográfica ajudou a selar esse sucesso. A JK não é uma escritora brilhante. Ela seguiu fórmulas muito utilizadas e conhecidas pra compor Harry Potter, e usou artifícios preguiçosos pra explicar certas coisas que ela incluiu só pra não fugir da receita da jornada do herói.
Ela foi uma marketeira inteligente que soube exatamente o que faria o livro dela vender.
Referências bibliográficas

A jornada do herói mitológico - Luiz Eduardo Ricón
O narrador - Walter Benjamin
O mito do herói e sua jornada em Harry Potter e a pedra filosofal - Débora Ulian Mendes
A literatura fantástica: caminhos teóricos - Ana Luiza Silva Camarani
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