Histórias da Zona Oeste do Recife - A Thread 👇
No Recife, é comum se deparar com rixas entre as Zonas Norte e Sul. Isso porque ambas possuem identidades nítidas em nossos imaginários. Os bairros nobres da ZN conservam o passado colonial, enquanto os da moderna ZS procuram se projetar como uma espécie de Barra da Tijuca +
Diante disso, sempre me questionei qual seria a identidade da Zona Oeste, área que existe mais geograficamente e menos no imaginário, sobretudo daqueles que vivem em outras Zonas. Nesse fio, vou compartilhar curiosidades históricas na busca desse imaginário. +
Por muito tempo o Recife urbano foi restrito ao Centro. A Zona Oeste era composta por engenhos que faliram no começo do 20 e logo foram loteados com casinhas e terrenos para a classe trabalhadora. Assim nasceu esse grande subúrbio que hoje conhecemos. +
Um bom exemplo desse processo de engenho que foi loteado é Jd. São Paulo. Abaixo, o anúncio da venda dos lotes do Engenho São Paulo e o antigo casarão. Até hoje o bairro preserva um certo aspecto interiorano, com pracinha, Igreja Católica e pouca verticalização. +
O Engenho do Meio é um exemplo que conservou o nome do passado. Em sua Casa Grande nasceu Joaquim Amazonas, o primeiro reitor da UFPE. Foi ele quem não permitiu o loteamento do engenho, pensando no campus. Hoje, é nas margens do Engenho do Meio que fica a Cidade Universitária. +
Esse aspecto interiorano e até feudal marcou Várzea (grande área, mas pouco loteada e com presença de família poderosa). As terras do Engenho São João da Várzea foram compradas pelos Brennand, descendentes de ingleses, na década de 1930. Foto da Casa de Ferro. +
Foi na Usina São João da Várzea, em 1947, que foi construída a Fábrica de Cerâmica Brennand, desativada duas décadas depois e recuperada pelo artista plástico Francisco, em 1971, para criar uma oficina. Ele costumava dizer que a "Várzea é o umbigo do Brasil". +
Do outro lado do Capibaribe, Ricardo, primo de Francisco, inaugura em 2002 um museu de aspecto medieval. O Casarão da Várzea, símbolo recente de resistência patrimonial, e a Coudelaria Souza Leão, referência na criação de cavalos, também conservam esse imaginário feudal da Z.O. +
Os bairros Cordeiro e Caxangá também possuem um passado ligado aos engenhos. As marcas da ocupação holandesa também estão Z.O. Muita gente não conhece as ruínas do Forte Arraial Novo do Bom Jesus, nos Torrões, erguido em 1645 para guardar munições dos portugueses. +
Mas nem tudo é engenho. O bairro de Areias começou a se urbanizar na Segunda Guerra Mundial, em 1940, com a inauguração da Vila das Lavadeiras, onde mulheres lavavam e passavam - prática antes realizada em beiras de rios e córregos. O próprio Getúlio Vargas foi na inauguração. +
Lá nasceu uma tradicional agremiação do carnaval: a Troça Carnavalesca Mista Lavadeiras de Areias, criada em 1940 por Amara dos Santos, Aide de Albuquerque, Severina de França, Eunice Machado, Jovelina de Anunciação e Lindalva Dantas. Uma ancestralidade que está sendo esquecida +
Z.O também é resistência. Em 1987, na Era Sarney, famílias ocuparam cerca de 60 hectares de uma área pertencente ao governo federal no bairro de Torrões. Batizaram o local de Roda de Fogo, uma novela da TV Globo na época, e protagonizaram uma luta do direito à moradia. +
Na década de 1930, o bairro do Jiquiá recebeu a primeira estação aeronáutica para dirigíveis da América do Sul. No Brasil, os zeppelins da Europa tinham rota apenas no Recife e no Rio. Hoje, a Torre do Zeppelin é o único objeto desse tipo ainda de pé em todo o mundo. +
A história da ferrovia do Recife também tem muito a ver com a Z.O. Entre Areias e Jd. São Paulo ficava o grande depósito de locomotivas da cidade, o Parque Ferroviário Edgard Werneck, nome que homenageia o engenheiro da companhia ferroviária inglesa Great Western. +
O nome da Estação Werneck (aproveitada pela CBTU) antes era Estação Areias. Foi alterado em 1925, quando o engenheiro foi morto por investigar e denunciar um esquema de corrupção na Great Western. Essa foto, tirada por mim em junho, evidencia mais uma vez o aspecto interiorano. +
A Avenida José Rufino já foi uma estrada para ligar engenhos e ranchos a Afogados e Centro. Quem passa pela via vê casarões em ruínas. Entre eles está a casa onde o baiano Castro Alves, “o poeta dos escravos” e ícone do romantismo brasileiro, viveu no bairro do Barro. +
O Jardim Botânico do Recife fica no Curado, que é um dos bairros mais arborizado do Recife. A Zona Oeste, no geral, é bastante arborizada e áreas mais próximas do Jardim são bastante conhecidas pelo clima mais ameno. +
E essas foram algumas curiosidades que considerei importantes de compartilhar. Isso porque muitas vezes sabemos de histórias sobre o outro lado do mundo, mas não conhecemos tanta coisa interessante que está bem em nossa volta. +
E também porque por muito tempo acreditei que a história do Recife estava apenas no Centro ou casarões da ZN. Mas o Recife, como sempre, nos surpreende e tem muito a contar. +
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