Esse prédio fica em Boa Viagem. Av. Conselheiro Aguiar, 5000. Sua arquitetura sempre me chamou atenção, nunca soube o que era até que resolvi pesquisar e descobri coisas tenebrosas. Segue a trhead:
Lá funcionou um hotel com o famigerado nome "Hotel Casa Grande e Senzala". Não bastando o nome, eles bolaram um evento chamado "Ceias Dominicais". Todo domingo pela manhã eles tentavam recriar o clima do Brasil Colonial. Isso foi no ano de 1972.
"No terraço colonial você vai voltar a um passado delicioso [...] E você é atendido na hora por mucamas sempre prontas a lhe servir". Sim, eles vestiam mulheres de mucamas e elas serviam a alta sociedade Recifense da década de 70.
"Mucama" era o termo usado pra designar mulheres negras escravizadas que atendiam aos serviços da casa e não da lavoura. Cuidavam das crianças, dos serviços domésticos e de acompanhavas as brancas em seus passeios, afazeres e caprichos.
O hotel fantasiava as mulheres de mucamas
O hotel fantasiava as mulheres de mucamas
"Sinta o clima de um tempo aristocrático e elegante. A volta em grande estilo ao passado colonial". A atividade durou do inicio da década de 70 até meados da 90.
Era uma atividade elogiada em colunas da "alta sociedade". "A iniciativa vem beneficiar, e muito, às donas de casa, que, agora, podem passar os domingos sem maiores preocupações. [...] Tudo isso é servido a você pelas mucamas do Hotel Casa Grande".
No mesmo ano que inaugurou, já preparava revellions para os ricos moradores de Boa Viagem, principalmente. A high society.
Foi inaugurado em 1972. A ideia do empreendimento era essa mesmo "reconstituir o ambiente doméstico e acolhedor das casas Grades dos antigos engenhos pernambucanos. O serviço e atendimento serão feitos por mucamos (sic) e escravos trajados no estilo colonial".
Eles não se davam ao trabalho nem de frisar que era uma fantasia. Na chamada do jornal falavam que as pessoas seriam atendidos por escravos. "O serviço e o atendimento serão feitos por mucamas e escravos". A fantasia era neste nível. Era uma verdadeira "Ambientação Colonial".
Quem fez o discurso de inauguração foi o próprio Gilberto Freyre. Sociólogo recifense de grande importância. Escritor de Casa-Grande & Senzala; Guia Prático, Histórico e Sentimental da Cidade do Recife; Sobrados e Mucambos. Pra ele, o Hotel era uma grande homenagem à sua obra.
A cozinha regional do hotel foi tão prospera que abriram o "Restaurante Mucama". Um "ambiente refinado, sob um clima de exotismo e romance" os recifenses se divertiam neste show de horror. Sem perceber o quão errado estava tudo isso.
Em 1973 uma coluna que falava sobre os serviços de aviação e comissárias de bordo, "aeromoças" na época, tentou falar um pouco contra o racismo. Ela fala da vanglória dos brancos em dizer que o Brasil não tinha racismo. E questionava onde estavam as comissárias "de cor".
Tenho dificuldade até de destacar partes do texto. É tudo muito bizarro. Só me faz pensar quando nós, não pretos, juramos q estamos lutando contra o racismo e estamos sendo profundamente racistas. Dá pra ver no texto toda "boa vontade" de quem escreve, sem se aperceber do q fala.
E aí voltamos ao Hotel Casa Grande, que é citado na coluna como exemplo de inclusão, de luta contra o racismo. O hotel era um exemplo. Lá eles empregavam pessoas pretas e as vestiam de escravos e mucamas. Um exemplo moral para a sociedade recifense. (irônia)
A maior lição que tirei disso tudo foi: Às vezes nós, pessoas não pretas, simplesmente não vemos o que estamos fazendo. Estamos cegos pelo racismo. E quantas e quantas vezes vejo algumas dessas pessoas altamente ofendidas quando alguém chama atenção. Aponta que aquilo é errado.
O mínimo que devemos fazer é sempre estar atento aos sinais do oprimido. Parar de nos vangloriarmos pela "luta" que fazemos, mas que muitas vezes, é só mais opressão. No máximo uma "opressão um pouco menos desastrosa" que está muito longe de nos legitimar algum orgulho qualquer.